A corrupção que envolve a troca de favores entre os setores público e privado deslegitima as relações que empresas e conselhos mantêm com atores políticos. Como medidas anticorrupção exigem maior conformidade legal e transparência do setor privado, investidores passam a valorizar mais os vínculos das empresas com organizações não-governamentais (ONGs) em detrimento dos vínculos com atores políticos. As ONGs podem ainda contribuir para o posicionamento das empresas na medida em que as aproximam de questões sociais de interesse mútuo.
Em artigo publicado na revista “Organization Science”, a pesquisadora da FGV EAESP Marina Gama e os colaboradores Aline Gatignon, da Universidade da Pensilvânia, e Rodrigo B. DeMello, da Girard School of Business, investigam a percepção de investidores sobre a legitimidade de estratégias além do mercado no contexto da Operação Lava Jato.
A análise considerou o ano de 2014, que corresponde à primeira fase da operação. Conforme afirmam os autores, o período representou transição institucional, pois as empresas passaram a ser responsabilizadas por atos de corrupção. De acordo com entrevistas realizadas com líderes empresariais, representantes de ONGs, acadêmicos, investidores e outros atores, a investigação da Polícia Federal, à época, levou as organizações a revisarem práticas e relações entre empresários e políticos.
A amostra abrangeu 122 empresas não financeiras de nove setores listadas na Bolsa de Valores de São Paulo em 2013. Os pesquisadores buscaram o número de citações a ONGs e termos associados na análise de 163 relatórios anuais.
O estudo mostra que, no período, os investidores valorizaram mais os vínculos com ONGs do que os vínculos com atores políticos e as doações para entidades mais do que as conexões políticas de membros do conselho. Desfazer laços com atores políticos, de forma a limitar o uso do poder do governo para benefícios privados, foi uma das principais preocupações para que as empresas mantivessem o compromisso com a transparência e com rigor em suas condutas.