Um dos principais desafios da cadeia produtiva de grãos no Brasil é o déficit na capacidade de armazenagem. Isso porque, a cada colheita, se o agricultor não tem um silo para estocar seus produtos, ele acaba fazendo as vendas no pico da safra, quando os preços são mais baixos devido à grande oferta. Frente à carência dessas estruturas pelos produtores rurais, à necessidade das empresas fabricantes em vendê-las e à falta de financiamento público para esse tipo de transação, pesquisadores do Observatório para o Agronegócio do Centro de Inovação (FGVin) da FGV EAESP sugerem novas soluções de crédito com recursos privados. Em artigo publicado na revista “GV Executivo” de 14 de maio, os autores descrevem três dessas opções: fundos de investimento imobiliário, financiamento com uso de Cédula de Produto Rural (CPR) e financiamento via portfólio finance.
No primeiro caso, as instituições financeiras e gestoras de recursos oferecem a seus clientes a possibilidade de investir em fundos de ativos imobiliários rurais, como silos e unidades de armazenagem em fazendas, tendo em vista a alta demanda por essas estruturas. O rendimento para os investidores que aportam recursos nesses fundos vem do aluguel dos imóveis por produtores rurais, tradings ou agroindústrias. Ao mesmo tempo em que gera renda ao investidor, esse tipo de estrutura contribui para a expansão da capacidade de armazenamento no agronegócio, já que aumenta a disponibilidade de silos e unidades armazenadoras no campo.
No financiamento com utilização de CPR — título de crédito relacionado a certa quantidade e qualidade de determinado produto agrícola –, os agricultores usam esses títulos para viabilizar a compra a prazo dos silos das empresas fabricantes. Nessas operações, o produtor rural coloca o valor que será recebido com as safras de anos futuros como garantia de pagamento para o fabricante.
Já o modelo portfólio finance parte da mesma premissa da CPR, com a diferença que a empresa fabricante não utiliza os seus próprios recursos para construir a unidade de armazenagem, pois o financiamento fica a cargo de um banco. “É uma triangulação agricultor, fabricante e instituição bancária. Nesse modelo, a empresa fabricante passa a ser a fiadora dos produtores rurais para os quais ela vai vender o silo. Para o banco representa uma operação segura, uma vez que a empresa assume parte ou a totalidade dos riscos”, explica Daniel Franco Goulart, coautor do artigo.
Soluções para o descompasso
Os pesquisadores citam dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que apontam que a evolução da capacidade de armazenamento no Brasil aumentou 76% entre 1980 e 2018, enquanto a produção de grãos cresceu 350% no mesmo período. “Esse é um grande problema em todo o país, especialmente no Centro-Oeste e nas novas fronteiras agrícolas, na região denominada Matopiba [iniciais dos estados Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia]. Essas novas alternativas de financiamento vêm no sentido de solucionar esse descompasso”, afirma Goulart.
De acordo com ele, as pesquisas relacionadas à inovação do agronegócio no campo financeiro devem continuar, principalmente no que se refere aos fundos de investimento imobiliários, que têm grande potencial de expansão. “Nos últimos anos, houve uma explosão desses fundos, que se tornaram atraentes devido à queda da taxa básica de juros. E com o sucesso dos fundos para ativos urbanos, viu-se a oportunidade de expandir esse modelo para ativos logísticos”. O modelo CPR também tem espaço para crescer, segundo Goulart. “Três empresas trabalham atualmente com ele num universo de 20 a 30 fabricantes”, afirma.