Historicamente, as religiões desempenham um papel importante no cenário político do Brasil. Organizações religiosas já participaram de debates relacionados à justiça social e fizeram oposição a governos autoritários. Mais recentemente, no entanto, grupos formados por políticos conservadores religiosos ganharam destaque e influência na política brasileira. Isso colaborou para a propagação de políticas conservadoras e moralistas, especialmente no campo da educação, impedindo o avanço de ideias progressistas no debate político.
A análise está em artigo publicado pelos pesquisadores da FGV EAESP Mário Aquino Alves e Andrea Pineda, em parceria com Catarina Ianni Segatto, da Universidade Federal do ABC (UFABC), na revista “Social Policy & Society”. Para investigar a influência de grupos religiosos nas políticas educacionais brasileiras, os pesquisadores analisaram a legislação educacional, projetos de lei e debates governamentais da área em três períodos de tempo, da colonização até os dias atuais. Entre junho e agosto de 2019, também realizaram quatro entrevistas com acadêmicos e representantes do governo.
Influência de religiosos conservadores a partir da década de 1980 dificultou o avanço de ideias progressistas em políticas educacionais no Brasil
Segundo o estudo, desde a colonização, a Igreja Católica participou ativamente do oferecimento de políticas e serviços de saúde, educação e assistência social – seja na construção de hospitais ou na defesa de direitos sociais, por exemplo. Ao longo do tempo, esses grupos também foram responsáveis por influenciar o desenvolvimento de políticas educacionais pelo governo federal.
No entanto, a partir da década de 1980, grupos protestantes Pentecostais e Neopentecostais começaram a ganhar destaque na política brasileira, particularmente no Congresso Nacional. Em 2005, deputados e senadores formalizaram a Frente Parlamentar Evangélica, que também contava com alguns membros ligados à Igreja Católica, conta o artigo.
A ascensão desses grupos religiosos trouxe uma nova dinâmica à política, inclusive na educação, caracterizada pela promoção de ideias conservadoras e moralistas, muitas vezes em oposição a políticas progressistas. Em 2018, esses grupos formaram coalizões que apoiaram a eleição e formaram uma grande base de apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro, que também defendia ideias mais conservadoras.
Segundo os pesquisadores, um exemplo que representa a consolidação desses grupos nas políticas de educação é o movimento “Escola sem Partido”, que dominou muitos debates políticos na última década. A iniciativa, defendida por grupos conservadores católicos e protestantes, tinha como um de seus objetivos eliminar questões relacionadas a gênero, diversidade e inclusão no ambiente escolar, por exemplo, influenciando leis e políticas educacionais. Os grupos popularizaram o termo ‘ideologia de gênero’, utilizando-o para mobilizar e sustentar a união entre os diferentes grupos conservadores.