A participação dos cidadãos em processos de tomada de decisão pública é um importante recurso para garantir o pleno funcionamento de sistemas democráticos. Uma das ferramentas utilizadas para isso são as plataformas virtuais, que aceitam a colaboração em ações governamentais por meio de fóruns, chats e questionários. No entanto, as dinâmicas de poder presentes nesses processos podem agravar desigualdades, limitando o espaço para discussões ou excluindo indivíduos desfavorecidos. Nesse cenário, diferentes grupos podem alterar as relações de poder ao mobilizar recursos durante o planejamento, a execução e os impactos da iniciativa. A forma de administração dos recursos de cada fase pode promover maior ou menor influência civil nos processos de tomada de decisão pública.
A análise está em artigo publicado pelas pesquisadoras da FGV EAESP Maria Alexandra Cunha e Marlei Pozzebon com Taiane Ritta Coelho no periódico “Information Systems Journal”. Para investigar as relações de poder em plataformas online de participação cidadã controladas pelo governo, as autoras realizaram três estudos de caso nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba. Nas três cidades, foram implementadas iniciativas para engajar os cidadãos a participarem no desenvolvimento de políticas públicas para a mobilidade urbana. Os autores coletaram os dados principais a partir de 32 entrevistas com membros do governo e usuários das plataformas de cada cidade entre outubro de 2017 e maio de 2018.
Cooperação entre profissionais e consolidação do conhecimento popular aumentam a influência civil nas políticas públicas
Na fase de planejamento, que consiste na construção do design da plataforma, o governo pode utilizar recursos para criar condições de empoderamento dos cidadãos. Um exemplo é a formação de alianças entre diferentes profissionais. A colaboração entre planejadores urbanos, experts em participação cidadã e equipes de tecnologia ajuda a descentralizar decisões sobre como serão as postagens e interações na plataforma, construindo espaços mais interativos e inclusivos. Na iniciativa Ágora-RIO, do Rio de Janeiro, por exemplo, os planejadores urbanos se juntaram a especialistas para criar espaços de maior diálogo e interação entre os cidadãos e o governo.
Porém, a existência das plataformas virtuais não é suficiente para permitir a influência civil nos processos. Na fase de utilização da plataforma, o compartilhamento e a consolidação de diferentes tipos de conhecimento pelos usuários – como o técnico e o popular – é a principal fonte de poder para influenciar a participação cidadã. Com isso, o conhecimento coletivo pode ser transformado em diretrizes a serem incorporadas pelo governo nas políticas públicas. O acesso à tecnologia também representa um importante recurso, já que os indivíduos de regiões menos favorecidas acabam excluídos dos processos pela falta de acessibilidade.
Na prática, a pesquisa aponta para a necessidade de desenvolvedores de plataformas de participação e administradores públicos fortalecerem a relação entre os governos e os cidadãos. Um dos principais desafios é valorizar o conhecimento popular e coletivo, combinando-o ao conhecimento técnico como forma de ampliar as oportunidades de participação.