O uso de dados pessoais no combate à pandemia da covid-19 serviu de base para políticas públicas de prevenção do contágio no Brasil e na União Europeia. O Brasil priorizou o direito à saúde frente à segurança e o consentimento do usuário sobre as informações coletadas por aplicativos como o Coronavírus – SUS. Já na União Europeia, as informações coletadas pelo poder público de cada país dependeram da aderência do público aos aplicativos e seus termos de uso, o que indica mais atenção à privacidade dos cidadãos.
Em artigo publicado na “Revista de Gestão dos Países de Língua Portuguesa”, pesquisadores da FGV EAESP realizam estudo de caso sobre as estratégias de coleta e tratamento de dados como geolocalização e atendimento à população em serviços de saúde nas duas regiões. A análise foca em soluções tecnológicas criadas no início da pandemia, em 2020.
No Brasil, os autores consideram o sistema de geolocalização InLoco, que gerou dados anônimos de isolamento médio por estado e de visitas a hospitais; o Sistema de Monitoramento Inteligente do Governo do Estado (SIMI SP), que cruzou dados de operadoras telefônicas com registros de saúde para emitir alertas sobre aglomerações e fornecer panorama do contágio no estado; e o aplicativo Coronavírus – SUS, que auxilia no acesso a informações confiáveis de prevenção e tratamento e gera dados de geolocalização dos usuários.
Pandemia evidenciou dificuldade em conciliar serviços coletivos de promoção à saúde e proteção de dados pessoais
Os autores indicam que, apesar de seguirem a legislação, os serviços brasileiros apresentam lacunas em segurança dos usuários. O Coronavírus – SUS, inicialmente, não contava com política de privacidade, e o consentimento da coleta de dados estava vinculado ao uso do aplicativo, por exemplo. No caso do SIMI SP, o artigo questiona a efetividade do serviço em nível intramunicipal por não detalhar dados específicos de menor abrangência geográfica, como bairros.
Os autores do artigo — Mariana Leite Fernandes da Silva, Marco Antonio Carvalho Teixeira e Eduardo de Rezende Francisco — destacam uma maior preocupação com a transparência na União Europeia. O aplicativo alemão Corona-Datenspende exige consentimento direto dos usuários sobre o tratamento de dados pessoais – ao contrário do Coronavírus – SUS, cujo consentimento é presumido pelo uso do aplicativo. O artigo destaca o desafio de equilibrar o direito coletivo à saúde e o direito individual à proteção de dados, visto que um destes será escolhido como prioridade em cada contexto.