Por Rogiene Santos – rogiene.santos@fgv.br, professora da FGV EAESP,
Tendo em vista que em abril deste ano o número de inadimplentes foi de 71,44 milhões, de acordo com dados do Serasa, mostra-se necessário que a educação financeira faça parte das políticas públicas no Brasil. Mas qual é o papel das políticas públicas? De maneira resumida, elas são fundamentais para o desenvolvimento da sociedade, pois influenciam como o governo capta e investe os recursos com o objetivo de promover o bem-estar social. Portanto, elas buscam garantir direitos à população em relação à saúde, educação e ao lazer. Dessa forma, são capazes de mudar a sociedade ao longo do tempo.
Tendo em vista que a falta de educação financeira tem afetado grande parte das famílias brasileiras, nos últimos anos, o governo tem se mostrado preocupado com essa situação e tem buscado algumas formas de lidar com tal problema. Isso porque a educação financeira, como política pública, é uma maneira de contribuir para o desenvolvimento financeiro e econômico do país. Em 2021, o Fórum Brasileiro de Educação Financeira (FBEF), do qual a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) faz parte, divulgou quais seriam os princípios e diretrizes para a implementação da Nova Estratégia Nacional de Educação Financeira.
Alguns estudos analisaram a trajetória que levou o estabelecimento da Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF) no Brasil. De acordo com alguns pesquisadores, foi no início dos anos 2000 que a inclusão financeira passou a ser vista como uma ferramenta de combate à pobreza, tanto por órgãos brasileiros quanto internacionais. Ao longo dos últimos anos, especificamente, há um fortalecimento da educação financeira nas políticas públicas no nosso país.
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) busca garantir os direitos de aprendizagem e desenvolvimento de todos(as) os(as) estudantes brasileiros(as) da educação básica, fundamental e do ensino médio. A BNCC incluiu a educação financeira como um dos temas transversais que devem ser trabalhados em diferentes disciplinas ao longo dos anos escolares.
Apesar dos esforços em levar a educação financeira para a sala de aula, a maioria dos professores acredita que falta formação nesse aspecto para eles. Especialmente porque as escolas não têm acesso a material didático de qualidade para desenvolver habilidades de finanças pessoais nos alunos. Por conta da falta de formação dos professores nessa área, a maioria deles tem dificuldade em aplicar os conceitos de educação financeira nas suas disciplinas. De acordo com uma pesquisa do Instituto XP e da Nova Escola, cerca de 23% dos docentes usam educação financeira no contexto das aulas.
Esse dado traz algo que é essencial quando falamos de educação financeira. Não é suficiente ter políticas públicas que incluam este tema no currículo das escolas. É necessário haver preparação ou contratação de professores capacitados nessa área.
Outro desafio em relação à educação financeira é tornar os conceitos básicos desta área acessíveis à população. O mesmo desafio é enfrentado nas escolas na tentativa de ensinar esses conceitos aos seus alunos. No processo de ensino da educação financeira é essencial que sejam considerados elementos do contexto dos alunos.
Inserir a educação financeira na sala de aula é uma forma de prevenir problemas futuros com relação, por exemplo, à inadimplência. Porém, há a outra face da moeda – as pessoas que não estão na escola, mas enfrentam esse tipo de problema. Sabendo disso, no início deste ano, o governo anunciou que criará programa para atender endividados e que os beneficiados do Auxílio Brasil serão atendidos pelo programa, especialmente quem contraiu empréstimo consignado.
Lembro de quando o Governo Federal anunciou que iria liberar esse tipo de empréstimo para quem era do programa Auxílio Brasil. De pronto vi que não seria uma boa solução, pois o brasileiro médio não analisa as implicações de decisões financeiras como essa e acreditou que esse empréstimo seria bom para ele. Mas será que foi mesmo? Ou foi bom para os bancos que aderiram a esse programa em que o risco de crédito para eles era praticamente nulo?
Outro ponto que também sou crítica é em relação ao fato de os programas de transferência de renda não oferecerem educação financeira para os seus beneficiários. Na minha opinião, deveria haver um programa que ajudasse as pessoas a utilizar o dinheiro do Auxílio Brasil da melhor maneira possível. Como o próprio nome diz: é um auxílio e não algo que será para a vida toda. Alguns podem argumentar que não dá para se pensar em educação financeira em situação de vulnerabilidades. Mas, vejo a educação financeira como uma forma de ajudar as pessoas aumentarem o seu conjunto de escolhas. Para além disso, vejo a educação financeira como uma forma de aumentar o bem-estar social.